Buscamos, neste texto, aprofundar um pouco as ideias que já apresentamos sobre a proposta de reforma tributária que pretendo, em breve, entregar para a análise dos ilustres membros desta Comissão. Aproveito, mais uma vez, para elogiar o trabalho realizado pelo antigo relator, o Deputado André Moura, com quem compartilho a mesma análise dos problemas do nosso atual sistema tributário e também a mesma convicção da necessidade urgente de reformá-lo. Penso apenas que, a proposta por ele apresentada, que mantinha a mesma estrutura atual dos tributos, apontando para uma unificação da tributação do consumo apenas em um futuro remoto, é insuficiente diante dos graves problemas atuais. É por isso que defendo que é preciso ousar mais e definitivamente tirar o Brasil desse emaranhado de tributos sobre o consumo com não cumulatividade incompleta, guerra fiscal entre os entes federados e tributação sobre a renda profundamente regressiva, e nos alinhar com os modelos de tributação existentes no resto do mundo desenvolvido. Nesse sentido, pretendo propor um sistema tributário no modelo europeu, baseado em um imposto de renda federal, um imposto sobre valor agregado e um imposto seletivo estaduais (mas com legislação federal), e impostos sobre o patrimônio municipais (alguns com legislação federal). Outra característica de nosso sistema tributário que o difere daqueles dos países desenvolvidos é a grande concentração da arrecadação na tributação sobre o consumo em detrimento da arrecadação sobre a renda, o que termina por onerar mais gravosamente os pobres, já que estes são obrigados a aplicar a maior parte de seus rendimentos na aquisição de bens materiais e serviços. Enquanto, na média os países da OCDE recebem 37% de suas receitas da tributação da renda e 25% da do consumo, no Brasil, a tributação sobre bens e serviços responde por 51% da carga tributária, enquanto a sobre a renda representa somente 18%. É por isso que pretendemos deslocar parte da tributação sobre o consumo para a renda, buscando atingir, grosso modo, distribuição similar a dos países da OCDE. Contudo, em hipótese alguma admitiremos aumento da carga tributária total, que deve permanecer em torno de 35% do PIB. A outra linha mestra de nossa reforma é garantir que os entes federados partilhem suas arrecadações, fazendo com que todos se comportem como sócios, e não como inquilinos, do sucesso de nossa economia. Penso que uma das razões das reformas anteriores terem falhado foi por se concentrarem sobremaneira na partilha dos tributos, e não na construção de um sistema economicamente simples e eficiente. Passemos, agora, a detalhar melhor tais ideias. REDISTRIBUIÇÃO DAS COMPETÊNCIAS TRIBUTÁRIAS União A União continuará com os tributos sobre o comércio exterior (Impostos de Importação e Exportação), com o Imposto de Renda, com as contribuições previdenciárias e com tributos regulatórios (CIDE). O IPI será incorporado ao Imposto sobre Valor Agregado – IVA, e o ITR passará para a competência dos Municípios. O IOF será possivelmente extinto, pois entendo que ele hoje possui função mais arrecadatória que regulatória, mas isso demanda maiores reflexões. Não pretendo, a princípio, alterar a possibilidade de implantação do Imposto sobre Grandes Fortunas, a não ser que se chegue ao consenso de trazer o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCD para a esfera federal, como discutido mais adiante. Quanto às contribuições sociais, a CSLL será incorporada ao Imposto de Renda, e o Pis, ao IVA. Ao menos por enquanto, não haverá alterações nas contribuições ao Salário-educação e ao Sistema “S”. Para reduzir a contribuição previdenciária sobre a folha de salários, será criada uma contribuição sobre movimentação financeira. Destaco que, recentemente, fui contra o retorno da CPMF com mera função arrecadatória, mas entendo que ela pode ter uma função importante na redução da carga tributária sobre a folha, reduzindo os custos de contratação. Além disso, a contribuição sobre movimentação financeira obrigará que todos arquem com a Previdência, mesmo aqueles que gozam de isenção ou imunidade das contribuições sobre a folha. Quanto ao Imposto de Renda, não será suficiente promover alterações apenas no texto constitucional, sendo também necessária a apresentação de projeto de lei que o regule. Como se pretende deslocar parte da carga tributária da tributação do consumo para a da renda, não será possível simplesmente o aumento de alíquotas, mas sim uma reformulação total do sistema, buscando-se alcançar bases antes pouco exploradas. Além disso, deve-se garantir sua efetiva progressividade, de modo a taxar, de fato, mais gravosamente os ricos. Estados e DF As competências dos Estados e do DF serão profundamente alteradas. O ICMS será incorporado ao IVA; o IPVA passará para a competência dos Municípios; e o ITCMD passará para a competência dos Municípios ou da União. Os Estado passarão a contar com o Imposto sobre Valor Agregado, que agregará os antigos ICMS, IPI, PIS, Cofins e ISS, e será regulado por lei federal, com arrecadação centralizada e fiscalização pelos Estados e pelo Distrito Federal (pelo Superfisco Estadual, como se verá adiante).Esse imposto não será cumulativo, com concessão de crédito financeiro (tudo o que a empresa adquire e usa na atividade gera crédito), cobrado “por fora” (sem incidência de imposto sobre imposto), com arrecadação integral para o Estado de destino, e não onerará bens do ativo fixo nem produtos exportados. Além disso, terá alíquotas mais baixas para medicamentos e produtos alimentares. Para trazer a alíquota do IVA para valores compatíveis com a média dos países desenvolvidos, criamos também um Imposto Seletivo monofásico sobre alguns produtos, como petróleo, combustíveis e lubrificantes de qualquer origem, energia elétrica, bebidas alcoólicas e não alcoólicas, aparelhos eletroeletrônicos e eletrodomésticos, veículos automotores, supérfluos, telecomunicações, e qualquer outro produto ou serviço indicado em lei complementar. Esse tributo também será regulado por lei federal, com arrecadação centralizada e fiscalização pelos Estados e pelo Distrito Federal. Ainda é necessário ponderar se o Imposto Seletivo será o único tributo a incidir sobre esses produtos, ou incidirá em conjunto com o IVA. Municípios Os Municípios perderão o ISS, que será incorporado ao IVA. Por outro lado, receberão a competência do IPVA e do ITR, mas regulados por legislação federal. Quanto ao ITCD, a ideia original é também entregá-lo aos Municípios, também regulado por lei federal, concentrando a tributação do patrimônio na esfera local. Contudo, também considero a possibilidade de elevá-lo à esfera federal, como um significativo imposto sobre o patrimônio, em substituição ao Imposto sobre Grandes Fortunas, como é feito nos Estados Unidos. Isso porque os grandes patrimônios estão normalmente espalhados por diversos Municípios, sendo mais consistente onerá-los com um tributo de alcance nacional, além de a Receita Federal estar melhor equipada para uma fiscalização dessa natureza, em conjunto com o Imposto de Renda. Nossa reforma também trará dispositivos que proibirão que os Prefeitos concedam isenções indiscriminadas em seus tributos, em detrimento das finanças municipais. SUPERFISCOS Para arrecadar os novos IVA e Imposto Seletivo, entendo ser importante a criação de um novo órgão, que agregará todos os Fiscos Estaduais, e será de competência conjunta dos Estados e do Distrito Federal. Esse órgão será dirigido por um Secretário Nacional, contará com Superintendentes em cada unidade federada (ou possivelmente em regiões que agreguem alguns Estados), e terá estruturas de carreira e remuneratória unificadas . Além disso, será pautado pelos princípios da unidade, indivisibilidade e independência funcional. Já a Receita Federal se concentrará na fiscalização e arrecadação do novo Imposto de Renda, das contribuições previdenciárias dos empregadores e dos empregados, da contribuição sobre movimentação financeira, e dos tributos aduaneiros e regulatórios. PARTILHA Como já esclarecido, pretendemos garantir que os Entes Federados sejam sócios do sucesso do país, exigindo que todos compartilhem do resultado de suas arrecadações. Assim, evita-se que se concentre a arrecadação em tributos não partilháveis, como foi feito pela União com as contribuições sociais. Nesse sentido, garantiremos que Estados, DF e Municípios recebam uma parte do Imposto de Renda, bem como que a União e os Municípios tenham direito a um quinhão do IVA e do Imposto Seletivo. De qualquer modo, para se evitar as desconfianças naturais com uma mudança tão profunda, nos primeiros anos após a reforma se garantirá que cada ente federado mantenha o quinhão de sua arrecadação nos mesmos moldes dos anos anteriores, evitando-se perdas com o novo modelo. Para isso, calcularemos a participação de cada Município, Estado e União na arrecadação dos últimos anos dos tributos que estão sendo alterados, e garantiremos que esse mesmo percentual lhes seja entregue com base na arrecadação dos novos tributos. Elaboraremos uma regra de transição que, em alguns anos, transfira essa partilha com base nas arrecadações anteriores para o novo modelo. São essas as ideias gerais da reforma que pretendo implantar, e que trago para a análise dos senhores, de quem espero críticas e contribuições valiosas para que, juntos, possamos dar ao Brasil a reforma tributária de que tanto necessita.

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